domingo, 20 de maio de 2012

opinião: Quando é greve, a situação é grave

Pensar com imagens leva-nos a questões importantes. Greve remete a 1979, uma multidão de trabalhadores, prontos para produzir o que eles nem sabiam que iria se transformar aquilo: história. Pediram 65% de aumento, receberam 63%. Líder grevista: barbudo, analfabeto, Luiz Inácio Lula da Silva. Partido de luta dos direitos dos trabalhadores: PT.
E fez-se movimento. Depois de três tentativas e jogos de manipulação (quando não há manipulação? Este texto tende também a uma manipulação, cuidado!) aquele que o trabalhador, enfim, vê-se representado – imagem – assume a cadeira no Planalto Central: Presidente Lula.
Certo é que, nem era tão barbudo nem tão analfabeto como em 1979, e nem era metalúrgico, como antes. Há um bom tempo que não o era, se prestou a participar de organizações, expansão do Partido dos Trabalhadores, na consolidação da imagem daquele partido político surgido da luta dos trabalhadores contra os patrões.
Quando então assume a Presidência, descobre-se que nem sempre o líder é o responsável pelos sucessos e nem pelos fracassos da ação de seu governo – Itamar só foi chamado de pai do Real por FHC depois de morto e Lula jura que não sabia do mensalão.
Mas a questão grave que quero tocar neste momento é a respeito deste movimento grave de insatisfação nos trabalhadores que acaba por culminar numa greve. Ora, sabido é (e isso é o perigo, o sabido!) que a chegada ao poder do Partido dos Trabalhadores é resultado de certa imagem que se construiu a respeito de sua inclinação à luta pelos direitos dos trabalhadores. E quando o patrão é o PT? Como isso fica? Distorção da imagem.
Sabemos que segundo as leis que regem o bem-estar da nação, é lícito fazer greve. Tão lícito que a Justiça pode considerá-la ilícita. Uia! Complica.
Disse aqui apenas de Lula, mas poderia dizer de outros tantos, como o prefeito de minha cidade, que foi eleito e re-eleito com a imagem “Professor!”, dos Trabalhadores, ex-sindicalista, mas que até hoje (pode ser que amanhã o faço) não foi capaz de propor alguma mudança significativa ao magistério sandumonense, e apesar de movimentos pró-greve em anos consecutivos, ainda não houve a aprovação do Projeto de Lei de valorização da carreira de magistério, que tramita, há pelo menos 4 anos, na Câmara Municipal de Santos Dumont. E como ficam os vereadores? Complicado.
O que aconteceu com os partidos dos trabalhadores? Partiu-se demais? O que aconteceu com a força da grave? Algo mudou, mas a imagem não.
Quando Lula fora líder sindical fora fácil identificar os seus opositores, que com o passar do tempo, atualizou-se na imagem do PSDB – aqui falo dele, apesar da Presidência ser ocupada, atualmente, por uma mulher (o que pode ainda produzir muitos pensamentos singulares e potentes), por ele ainda representar imageticamente uma referência à luta pelos direitos dos trabalhadores e pelos mais vulneráveis socialmente; e não por acaso, agora, sua imagem está presente nos meios de comunicação ao lado de candidatos a cargos eletivos de 2012.
Hoje, vemos uma aliança entre PT e PSDB, por exemplo, na capital mineira. Como bem dizem, o Brasil costuma se identificar muito com os padrões da teledramaturgia. Será que, na onda, “Avenida Brasil”, os políticos resolveram também abandonar o maniqueísmo mocinho versus vilão – trabalhadores versus patrões  ou PT versus PSDB para deixar assim, mais emocionante, já que estávamos muito livres desde a redemocratização?
Houve uma mudança na imagem ou outra imagem vem se construindo ou ainda, outra já fora destruída, mas cismam em querer retomá-la. A greve, o Lula, o PT, os patrões e os trabalhadores de 1979 já não existem mais. O que tornam as coisas mais graves. Não sabemos como proceder, se antes tínhamos um governo PSDB, de burgueses famintos e opressores, hoje, temos uma chamada classe C que ascende com poder de consumo, apoiada num governo dos Trabalhadores, há pelos menos 12 anos, que teme regredir no alfabeto.
Os líderes que ensinaram, que mostraram que a greve é um dispositivo potente, democrático são, neste momento, os que buscam na Justiça uma justíssima justificativa justa para o fim da greve. Os sindicatos, em muitos casos, ainda atrelados a partidos políticos, como fora em 1979, tentam, perigosa e alucinantemente, relacionar desejos partidários com desejo de uma classe, dizendo fazer política em ano eleitoral.
Um aspecto que vem acentuando-se a cada movimento de greve é a mobilização dos trabalhadores, cada vez mais eles participam menos. E por ter uma participação menor que os aproximadamente 3,2 milhões de trabalhadores de 1979, demonstram a greve como dispositivo ineficaz diante de decisões judiciais favoráveis aos patrões que questionam a sua legalidade e diante de uma opinião pública desinformada, única a sofrer diretamente as consequências da má qualidade dos serviços e sua paralisação. A greve de hoje está longe de garantir os 63% dos 65% exigidos, como a de 79.
Como proceder ante a história da greve, a estes históricos de recentes greves, nestas atuais greves, na situação grave? Não sabemos. Não sei. Talvez este deveria ser o enfrentamento dos grevistas e por conseguinte, dos patrões-governos. O não sabido, a nova imagem que surge, os novos trabalhadores e os novos governos. Não podemos nos portar como antes, frente a um governo que sabe, como ninguém, não todos os movimentos, mas que já experimentou muitos movimentos possíveis graves de uma greve. Precisamos surpreender, criar, para que não continuemos a ser surpreendidos por decisões que despotencializam, que nos fazem desacreditar, que nos decepcionam frente a mudança que não traz vida. Talvez a greve já não seja o melhor dispositivo. Talvez o contrário seja mais potente. Trabalho ao extremo. Execsso de produção. Trabalho, trabalho e trabalho. É preciso buscar outras saídas; escapar, perfurar, minar certas imagens, desapegar-se de verdades. Uma greve outra, um trabalho outro? Isso dá muito trabalho. Não sei. Sem certezas, sem modelos, sem herois. O jeito é ir fazendo sem saber, e por isso, a situação torna-se ainda mais grave.

Fonte: http://www.abcdeluta.org.br/materia.asp?id_CON=145

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