quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Mais uma ideia da[´] ideia de greve

Um dos últimos textos que escrevi aqui, não por acaso, fora a respeito da greve. Naquele momento, e dada análise historicista feita, percebi que havia pouco espaço para que algo novo se desse: que a categoria de servidores, no caso, a de professores fosse ouvida e tivesse suas reivindicações aceitas em sua totalidade.
Atentei para a característica da imagem do governo dos Trabalhadores que fora construída a partir das famosas greves das décadas de 70, que tinha como líderes muitos ocupantes de cargos administrativos federais de hoje.
Acompanhei também através das redes sociais os velhos jargões relacionados ao populismo da greve: muitos, mas muitos postes a respeito de certa manipulação por parte da mídia dita de direita aliada a um governo dito de esquerda, que obscurece aspectos fundamentais das reivindicações dos servidores, através das máscaras novelísticas. E ainda tem o julgamento do mensalão.
O tempo passou e certas previsões fatalistas a respeito da greve dos professores se cumpriram. O governo pouco avançou nas negociações, apresentando propostas que, de fato, pouco modificaria o estado em que as coisas estão. Basicamente,  se mobilizaram  por aumento significativo do salário e reestruturação da carreira, de modo a diminuir a discrepância entre servidores de uma mesma categoria. E outras categorias de servidores federais iniciaram outros movimentos grevistas, buscando, quase que o mesmo. E neste ponto que o caso se desdobra em muitos. E aí, poderia usar uma trama de conceitos, mas que na voz de Renato Russo toma forma de “o mais do mesmo”.
Quase 3 meses de greve nas universidades com prejuízos difíceis de calcular, em comparação ao escândalo instantâneo gerado pelas faixas afixadas por polícias federais paralisados que soam aos ouvidos como “drogas a solta”, “livre pra bandidagem”, “medo a solta”, o movimento grevista docente vislumbra a amarga derrota agarrada a uma imagem tradicional da greve.
A greve, que já é regulamentada por lei, vira discussão governista na busca de dispositivos e decisões judiciais que a impeçam, situação paradoxal, se fizermos novamente uma análise histórica dos movimentos sociais e da ascensão partidária. A greve perdeu seu teor de exceção, surpresa e, principalmente, possibilidade de criação do novo. Os meios de comunicação já nem fazem muitas ressalvas a respeito da paralisação. Vi, pasmem colegas mais céticos, desde o início do movimento o jornalismo da Globo reservando lugar às notícias, certo que não abriram discussão, mas não é diferente em para outros assuntos. E nem soaram tão sensacionalistas como as envolvidas a paralisação dos policiais que causam mais temor.
Uniram-se aos professores outras tantas categorias, entre elas, Servidores do Itamaraty, Do IBGE, da Comissão Nacional de Energia Nuclear, da Agência Nacional de Cinema, da Anvisa, da Anatel, do Inmetro, do INPI, do Incra, da Secretaria de Patrimônio da União, da FUnai, do Inep,  do FNDE, só para falar de algumas. Mas se unem de certa forma na promoção de outra desunião. Todos servidores da União. Mas eis que se dá a diferença na repetição.
Assistimos a uma avassaladora jogada de marketing prol professores, de qualquer nível de ensino. Mas vemos outra realidade diferente da propagandeada. Uma ilusão que temos e que causa obscuridade ao tratar de servidores federais é discrepância entre as categorias e a própria dificuldade de articulação dentro das categorias, como exemplo, a presença de três sindicatos distintos que representam os docentes federais e que acabou por causar um dos maiores constrangimentos e dubiedade, pois um dos sindicatos, o com menor representatividade, acabou por aceitar a proposta governista dando a parecer que chegava ao fim a greve.
Outra dificuldade e diferença que se cria ao considerar a luta salarial e por estruturação de carreira entre os servidores de diferentes categorias  federais é a variação de valores. Só como exemplo, pego a categoria de Policiais Federais, que apesar de pouco tempo em greve, causou mais alvoroço midiático e entre os cidadãos que as outras categorias. Para ingressar na carreira, em nível médio, o salário é de R$3,2 mil; nível superior em qualquer área, R$ 7,5 mil e superior em Direito, para cargo de Delegado, R$13 mil.
Aos professores, o governo ofereceu um aumento que varia entre R$7 mil até R$ 17 mil, em média. Sabido que menos de 20% da categoria seria capaz de alcançar o último nível, visto o tempo necessário e o investimento em formação (doutorado). E o governo anuncia e o povo “pira”.
Se pegarmos ainda servidores do legislativo ou judiciário que ostentam os maiores salários e regalias da república, a discrepância salarial É maior, constrangedora e revoltante.
Apesar de nos apegarmos a uma imagem de consolidação de uma certa democracia, parece que estamos fixados numa imagem do passado-atualíssimo digno de governos autoritários e monárquicos dos tempos feudais.
Parece que os pensadores do Estado Moderno criaram outras implicações que vergonhosamente são envolvidas pela burocracia excessiva de Max as quais a tal isonomia dos poderes de Hobbes não se realiza na luta de classes do marxismo. Contemporaneamente, estamos agarrados a imagens irrealizáveis de idealismo.
Os movimentos grevistas, os abismos entre as categorias dos servidores – que impede pensar a ideia de UMA classe – a realidade partidária com suas alianças surpreendentemente assustadoras só me traz uma certeza: estamos diante de um espelho olhando para um rosto enrugado em busca de juventude.
Acho que já deu pra perceber que não existem heróis da democracia, nem salvadores da pátria nem mesmo progresso que dê conta acabar com opressões cíclicas. E longe de parecer pessimista, percebo que existem aí possibilidades outras ainda não exploradas. Uma delas é dar-se conta que nada está pronto, acabado, resolvido, garantido, para sempre instituído. Seja leis, edifícios ou cargos. Tudo ainda está em vias de ser modificado, transformado, feito, de se adequar, de ser criado. No entanto, é também necessário abandonar certas imagens e lugares cômodos institucionalizados; certas condutas. Quem sabe, talvez, em tempo de crise tão intensa internacional, não seja momento de, além de lutar por aumento salarial, seja tempo de lutar por reduções de salários insustentáveis. E é sempre importante lembrar, que por mais caro que sejam os gastos públicos, são também os mais pobres que pagam a conta.
É tempo de criar!

Informações:
Comando Nacional de Greve das IFES http://cngandes.blogspot.com.br/